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Resenha: O peso do pássaro morto, de Aline Bei


Os peitos e a fumaça
Resenha: O peso do pássaro morto, de Aline Bei

 

Resenha: O peso do pássaro morto, de Aline Bei

Por Jerusa Alves Furbino


Li o primeiro romance da escritora Aline Bei, O peso do pássaro morto, num fôlego só — e estou até agora sem ar.


Posso dizer, sem medo de errar, que é um dos livros mais tristes que já li em toda a minha vida. E olha que já li muitos livros que me fizeram chorar. Mas o livro da Aline, escrito dentro da estética da poesia — o que muitos chamam de prosa poética — tem uma densidade dramática admirável.


A trama é doída do início ao fim. A personagem sem nome poderia muito bem ser chamada de Esperança, pois Bei consegue matá-la ao final de um fim que já havia acontecido há muito tempo.


Aos oito anos, a personagem enfrenta seu primeiro grande drama: a morte da melhor amiga. Precisa lidar com uma ausência que não se cura, com a dor da saudade. Cresce sem a amiga-borboleta que a fazia sorrir. Nessa hora, fui levada ao meu primeiro contato com a morte. Eu também era criança, e fui ver, na casa da vizinha do prédio ao lado, o corpo do filho que havia morrido afogado. Minha mãe havia me advertido para não ir lá, mas ignorei o comando e fui com os outros amigos ver o menino dentro do caixão.


Voltei para casa e perguntei por que os mortos ficam com algodão no nariz. Não lembro qual foi a resposta da minha mãe, mas ela brigou comigo por ter desobedecido e ido ao velório doméstico. Depois desse dia, comecei a ir a todos os velórios que aconteciam onde eu morava. A morte não me causava medo, mas sim curiosidade.


Nasci em uma família espírita, e de certa forma, falar sobre morte e espíritos era algo comum lá em casa. O livro me levou à lembrança da morte de um amigo de quem eu gostava muito: o Wilsinho. Um menino cativante, que morreu muito jovem, com vinte e poucos anos. A gente quase não se via depois que terminou o colégio e eu vim estudar em Beagá, mas quando soube da sua morte prematura, senti meu coração partir.


Já tenho muitas mortes que causam dor na barriga. Saudade de vó, de pai, de mãe...Mas esta resenha não é sobre as minhas perdas — ainda que o livro nos obrigue a visitá-las. Ele faz com que revisitemos nossas dores mais profundas. Então, se você estiver em um momento delicado da vida, não leia.


Confesso que não estou em um bom momento. Inclusive, tenho consulta com a psiquiatra marcada para segunda-feira, dia 30 de junho. Mas, apesar da dor que o livro provocou no meu peito, eu simplesmente adorei a escrita da Bei.


Aos 17 anos, a mulher sem nome sofre um abuso. É violentada pelo namorado. Aqui, a gente morre junto com ela. Toda mulher, apenas por ser mulher, conhece o medo constante da violência. Mesmo que nunca tenha sofrido diretamente, carrega esse fantasma desde que nos ensinam, desde cedo, a “fechar as pernas”.


Aos 18, ela tem o filho da violência nos braços. Só ela sabe disso. Só ela — e nós, leitores — sabemos. Você consegue imaginar o peso disso? Aline constrói essa narrativa debaixo do tapete. Toda a sujeira do mundo está dentro da mulher sem nome, que carrega o peso da existência sozinha.


Já dá para imaginar como foi (ou não foi) a relação materna com o filho que tinha o rosto do pai abusador.


Quando ele era criança, entrou na vida dos dois um anjo: a vizinha Bete. Bete foi o laço entre mãe e filho. A mãe substituta. Mas Bete também morre.


Na coleção de ausências, a vida continua. O filho vai estudar fora, em Ouro Preto — essa cidade tão simbólica para Minas Gerais. Quando li isso, lembrei que também prestei vestibular lá, mas o destino não me quis por aquelas bandas e Beagá me acolheu. Ouro Preto tem uma densidade parecida com a do livro. É uma cidade cercada por ausências e tristezas históricas. Talvez por isso Aline tenha escolhido como destino do filho que nunca teve o pai — e teve tão pouco da mãe, que nunca esteve realmente presente.


No caminho para Ouro Preto, um cão abandonado entra na vida da mulher sem nome. Vira seu respiro. O cão chama-se Vento. Mais uma vez, o livro me provoca um gatilho: Vento era o apelido do irmão do meu ex-marido, uma pessoa encantadora, que se foi cedo demais numa curva dessas da estrada da vida.


Vento vira o único frescor da existência dela. Ela chega a se mudar do apartamento pequeno para uma casa velha e grande, só para que o cão pudesse circular com mais liberdade.

Mas, como era de se esperar, o Vento também se vai. E, com ele, esvai-se a última dignidade, a sanidade.


Nessa parte do livro, cada palavra parece cortar a pele. Eu chorei. Sangrei por dentro. Fiquei extremamente triste ao lembrar que não é só na ficção que a vida pode ser tão pesada assim.

Quantas de nós somos mortas em vida por abusos?


Somos muitas.


Minha solidariedade a todas.


O livro da Aline Bei é uma ode à dor. E isso o torna uma obra de beleza literária única. Aline Bei ganhou uma fã.


Eu nunca havia sentido vontade de escrever uma resenha literária sobre os livros que leio. Mas Bei despertou esse desejo em mim. E de agora em diante, quero tentar recomendar livros — além dos meus — para vocês.


Quero ler mais pessoas contemporâneas. Já leio bastante, mas quero começar a divulgar também. Tem tanta gente boa e competente nesse meio. Tenho feito tantos amigos e amigas.

Ser escritora contemporânea e ler autores contemporâneos é um privilégio.


Espero que gostem das dicas de livros que eu trouxer daqui pra frente.


Vamos fazer deste espaço um lugar onde as palavras ganham vida — e, mesmo na morte, carregam beleza.

 

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