AW-16679934614
top of page

As Cores que o Natal Pintou


Os peitos e a fumaça
As Cores que o Natal Pintou

O vidro embaçado da janela refletia o rosto fechado de Lucas. A chuva escorria do lado de fora, como lágrimas que o mundo derramava. Lucas observava a dança melancólica das gotas, acompanhando-as com os olhos enquanto o carro seguia pelas ruas molhadas da cidade. Cada gota que descia trazia uma lembrança: natais sem risos, casas sem brilho, anos em que a solidão era a única companhia que ele podia contar.


No banco de trás do carro de aplicativo, Lucas afundava no estofado, o olhar perdido. Passava pelos prédios decorados com luzes piscantes que pareciam zombar da escuridão que ele sentia dentro de si. "Tanta cor para um mundo tão cinza", pensava, enquanto um suspiro escapava de seus lábios.


Maria, sua empregada, vinha à mente. Uma mulher batalhadora, desgastada pela vida, mas que ainda conseguia sorrir, ainda que o sorriso carregasse a marca do cansaço. Ela havia pedido o dia de folga para tentar arranjar algo especial para os filhos. Cinco crianças. Cinco bocas para alimentar. Cinco corações que ainda acreditavam no Papai Noel.


Lucas sabia que Maria não tinha como comprar um presente sequer. Seu marido estava preso, condenado por roubar cinco caixas de bombons — doces que deveriam ter sido o presente de Páscoa das crianças. Era irônico. Um crime tão pequeno havia condenado uma família inteira à dor.


O carro parou em frente ao shopping, um lugar que Lucas detestava. Pessoas apressadas, lojas com vitrines exageradamente decoradas, uma música natalina ecoando pelos corredores. Ele entrou, carregando o peso do dever. Não fazia isso por generosidade, mas por obrigação. Um presente para Maria. Algo para aliviar o peso da vida dela, pelo menos naquele dia.


A loja de brinquedos era um caos de risadas e gritos infantis. Lucas passava pelos corredores como um fantasma, mal disfarçando o incômodo. Escolheu os presentes um a um, com um cálculo quase mecânico: uma boneca para a menina mais nova, um carrinho de controle remoto para o segundo, um jogo de tabuleiro para o terceiro, um quebra-cabeça para o quarto, e um livro de aventuras para o mais velho.


Quando finalmente estava saindo da loja, algo o fez parar. Era uma cesta de Natal, cheia de guloseimas: panetones, chocolates finos, biscoitos artesanais. Ele não sabia ao certo por que pegou a cesta. Talvez porque soubesse que Maria nunca teria como se dar ao luxo de comprar algo assim para si mesma.


Na saída do shopping, Lucas passou pela enorme árvore de Natal decorada no centro da praça. Crianças tiravam fotos com o Papai Noel, e seus risos ecoavam pelo espaço. Ele parou por um momento, observando. Aquilo o incomodava, mas de uma forma estranha. Não era o barulho que o irritava, mas a lembrança de algo perdido. Ele viu-se, por um instante, em uma memória distante: um menino de cabelos bagunçados, com as mãos ansiosas segurando um presente embrulhado, e sua mãe ao lado, sorrindo.


O motorista perguntou quando ele entrou no carro novamente:


—Shopping cheio, né? Natal é sempre assim.


Lucas grunhiu uma resposta indiferente, mas algo em sua expressão parecia menos pesado.

No dia seguinte, Maria chegou cedo à casa de Lucas. Encontrou uma pilha de pacotes coloridos com uma grande cesta de Natal ao lado, enfeitada com um laço dourado. Quando viu aquilo, as mãos tremeram, e ela cobriu a boca para segurar o choro.


— Senhor Lucas, eu... não sei o que dizer.


Lucas, visivelmente desconfortável, respondeu de forma ríspida:


— Não precisa dizer nada. Só leve para casa e aproveite o Natal com seus filhos.


Maria hesitou por um momento, mas então, sem pensar, deu um abraço rápido em Lucas. Ele ficou paralisado. Quando ela saiu, carregando os presentes, o silêncio na casa parecia diferente, quase acolhedor.


Lucas sentou-se no sofá, olhando pela janela. A chuva havia parado, e a luz do sol tocava o chão como uma pintura delicada. Pela primeira vez em anos, ele sentiu algo aquecer dentro de si. Não era apenas o alívio de um dever cumprido, mas uma sensação que ele mal reconhecia: alegria.


Ele tentou afastar o pensamento, mas não conseguiu. Lembrou-se do sorriso emocionado de Maria, das risadas das crianças no shopping, da memória de sua mãe, segurando sua mão em um Natal que parecia ter acontecido em outra vida.


E então, sozinho naquela sala, Lucas sentiu algo que parecia impossível: uma lágrima quente escorreu por seu rosto, mas dessa vez não era de dor. Era de gratidão.


Gratidão pela chance de, ao menos uma vez, colorir a vida de alguém — e, sem perceber, colorir a sua própria.


As cores que o Natal pintou no quadro daquele dia, nunca foram tão belas.





Posts recentes

Ver tudo

Comentários


JERUSA ALVES FURBINO DE FIGUEIREDO
Rua Henrique Passini 738/401 Bairro Serra
Belo Horizonte/MG CEP:30220-380
CNPJ: 41.768.492/0001-47

POLÍTICA DE PRAZOS E ENVIO
Data Estimada de Entrega de Produtos: Livros Físico: até 15 dias úteis.  
E-BOOK e cursos acesso imediato após o pagamento.

POLÍTICA DE TROCA E DEVOLUÇÕES
Prazo legal de 07 dias.  Troca de livros só em caso de defeitos.

 

  • Instagram
  • Facebook
  • TikTok
  • Youtube
  • Spotify

CONTATO
Email: JerusaFurbino@gmail.com
WhatsApp: 31 99 434 0000

FAQ
Em breve!

FORMAS DE PAGAMENTO 

JERUSA FURBINO FORMAS PAGAMENTOS.png
bottom of page