FELISTE

Feliste

Ouvi do Luca Scarpelli, um moço que sigo no Instagram, que todo adulto é feliste, uma mistura de feliz com triste! Ele fez um vídeo para criticar a trend do momento, que é: “Como posso ficar triste se este ano...”. Aí a pessoa vem e conta as maravilhas da vida que tem, as viagens incríveis que faz, os amigos maravilhosos que andam ao seu lado, o amor mais fantástico do mundo, ou seja, tudo perfeito no país das maravilhas chamado redes sociais.

Ao ouvir a expressão, achei-a perfeita! Tipo Eureka na descoberta! E quis escrever esta crônica da semana no blog, falando sobre ficar alegre, ficar triste, viver as emoções sem medo e não se sentir um lixo porque não consegue ser feliz o tempo inteiro. Ninguém consegue. Mas por que essa necessidade de só expor felicidade nessa rede que só pesca gente vazia?

Acredito que o mundo contemporâneo se perdeu no acesso fácil às superficialidades, e a realidade já não é mais suficiente para nutrir o ser.

Eu escrevo e cultuo a tristeza, não porque sou deprimida, mas porque sei da sua importância na minha vida. Vocês já devem ter compreendido isso por meio de vários poemas meus.

Mas o feliste me caiu como uma luva ao que aconteceu comigo na terça-feira, dia 3 de dezembro. Naquele dia, já acordei ansiosa por conta de uma palestra que daria à noite na Biblioteca Pública Municipal. O tema era: As Mulheres na Escrita Erótica e seus Tabus.

Desde que comecei a escrever, muitos dos meus textos passeiam pelo arrepio da pele. O erótico é uma mola propulsora para minhas palavras esculpirem o papel em prazer. Tenho uma persona erótica: A Ponto Jota. Em 2022, participei com um grupo de 13 mulheres da quentologia Mexerica, livro de sucesso organizado pela Cristina Rodrigues. Logo depois, no início de 2023, fui uma das fundadoras do Assanharau, único sarau erótico de BH, que, além do evento sarau, é também um grupo de estudos especializado no erotismo.

Fui convidada pelo meu histórico na área, mas, mesmo assim, estudei e preparei tudo com muita dedicação e afinco. Acontece que, na terça-feira, horas antes do evento, começou a armar um temporal. Por conta disso, saí de casa com duas horas de antecedência, pois sei do caos que se forma no trânsito quando o céu desaba. O evento estava previsto para 19h30. Cheguei às 19h10.

Fiquei aguardando até as 20h, e ninguém apareceu. Liguei para uma das organizadoras. Ela me disse que não conseguiria chegar por conta da chuva. Então, falei com o moço da portaria que podia fechar o teatro e que eu iria embora. Saí de lá frustrada, chateada, enfim, triste.

Cheguei em casa e fiz um post no Threads sobre minha palestra frustrada. No dia seguinte, ao acordar, meu post tinha viralizado: mais de 8 mil curtidas, mais de 2 mil comentários. A maioria se solidarizando comigo, mas, claro, também teve alguns comentários de ódio — os famosos haters —, falando que o tema da palestra era horrível, que por isso ninguém apareceu. Outros ainda disseram que isso era um sinal para eu mudar meu caminho e parar de falar desse tipo de assunto.

O conservadorismo ainda tem um grande espaço nas cabeças obsoletas. Infelizmente, vem crescendo esse movimento. Ser livre sexualmente e falar e escrever sobre isso ainda enfrenta preconceito por parte de quem não sabe ser livre.

Aproveitei a viralização do post para divulgar meu trabalho, e, inclusive, meu site ficou movimentado. De ontem para hoje, vendi 9 livros.

Então, a tristeza, a decepção e a frustração de terça-feira me renderam a alegria e o contentamento de hoje.

E a vida é assim: cheia de emoções durante o dia, durante o mês, durante o ano. É impossível vender felicidade em pote e sorrir 24 horas por dia.

Quando a tristeza vier, acolha. Faça massagem na dor até ela relaxar e passar...

Agora, se me perguntarem se sou feliz ou triste, responderei: feliste. Sou feliz com triste. As emoções me tomam, e eu bebo cada uma delas de canudinho.